terça-feira, 29 de abril de 2008

Outra Janela...

o silêncio...

No dia da dança...

Dança Para Um Poema
Dou-te a minha pele, a minha mão
Hoje sou a terra da criação
Passam rios
No meu corpo
Na minha voz
Navios
E embarcação

Hoje sou a terra onde nasceu
Onde minha tribo nunca morreu
Meus pés irão
Desenhar
O coração
A montanha
E a nação

Mostro minha dança
Vento, canção
Lírios e madeiras
Vinhos e pão
Mostro a ti
Com a minha mão
O amor, o sal
Pedra e paixão

Eu sou o jardim
O solo, o quintal
A dança do milho
A espiga afinal
Um corpo teu
Nele pisas
Inda não vês
Te alimentas
Inda não crês

Sou um continente
Desconhecido
Um salão de dança
A imensidão
A minha pele
A minha mão
Eu vou te dar
Te convidar
Para dançar

Comp. Consuelo de Paula e Rubens Nogueira

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Da janela norte...

na sombra do tempo

voz do povo

Com tempo e esperança, tudo se alcança.

sábado, 26 de abril de 2008

Da janela sul...

Ser à meia-luz


Ao entardecer...

I
Passo a mão pela tua cabeça,
recurvamente, atentamente, e só com dedos brandos,
olhando-a como passa e vendo onde passou.

Quero saber o que tu pensas.

II
O que tu pensas, mas apenas como,
e quando e o porquê, e não
que estejas pensando ou não que a minha mão,
atenta e curvada, passa brandamente.


Quero saber aquilo que nem sabes.

III
Aquilo que nem sabes - como saberias
o que o pensar é antes de pensar-se?


A mão que pousa e vai passar atenta.
O olhar que espera ver passar o gesto.
A tácita lembrança de volver os olhos.
A brisa que sabemos vai soprar tão mansa,
ainda antes, no fremir de pétalas ou folhas,
mas não na expectativa do arrepio prévio.

IV
Por que esperaste, ciente, a pele da minha mão?

Jorge de Sena

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Outra Janela...

Revolução.
Apenas quando somos instruídos pela realidade é que podemos mudá-la.

Bertolt Brecht

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Outra Janela...

à margem da corrente...

Autores

Como Uma Flor Vermelha

À sua passagem a noite é vermelha,
E a vida que temos parece
Exausta, inútil, alheia.

Ninguém sabe onde vai nem onde vem,
Mas o eco dos seus passos
Enche o ar de caminhos e de espaços
E acorda as ruas mortas.

Então o mistério das coisas estremece
E o desconhecido cresce
Como uma flor vermelha.

Sophia de Mello Breyner Andresen

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Os Livros...

O Marcador de Livros
Quando começou a ler o poema impresso no pedaço de cartolina, achou aquelas palavras familiares. Sabia que tinha escrito algo parecido, há um ror de anos, nos bons tempos da Revolução de Abril. Os seus olhos fugiram de imediato para o espaço onde estava o nome do autor. Sentiu uma onda de calor a iluminar-lhe o rosto e começou a sorrir de alegria, esquecido que estava na rua. Era mesmo um dos seus poemas...era o seu nome que estava transcrito depois do poema.
Encontrar um poema da sua autoria, num simples marcador de livros que aproveitava para publicitar a existência de um "Café com Letras", do qual nunca ouvira falar, era uma daquelas coisas que estava completamente fora das suas cogitações.
Durante uns breves minutos sentiu-se orgulhoso.

Um Café Com Sabor Diferente
Luís A. Milheiro

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Da janela sul...

entardecer na última linha - o Céu


Ao entardecer...

Nada me pertenceu - nem o vestido indecente
que pedi emprestado para te oferecer os seios, nem
os seios, que eram já teus muito antes do vestido.

O sorriso que devassou brevemente o meu rosto não
me pertenceu; porque ninguém o viu antes de ti,
nem o espelho se convenceu a devolver-mo.

Todas as coisas que a casa guardou quando partiste não
me pertenceram; porque, ao tocar-lhe nos dias mais
cinzentos, sinto que é pelo calor dos teus dedos que ainda
gritam; e mesmo a cama onde só teu corpo era bem-vindo
nunca chegou a ser inteiramente minha, pois, de contrário,
encontraria nela o meu lugar, e não o teu vazio.

Tu não me pertenceste - e, se uma vez acreditei que
acontecias dentro do meu corpo,das outras vi-te abraçar a
solidão com tanto ardor que concluí ser a memória quem
te mantinha vivo. O meu coração, contudo, sempre

te pertenceu - e a mão desesperada que o procura não
sente bater longe do teu peito. E mesmo os poemas todos
que escrevi não me pertenceram, porque essa vida
que pulsava no papel levaste-a tu contigo na hora
em que te foste - e a que tenho agora é mais
branca e vazia do que a morte, não é vida nem nada

que eu queira alguma vez que me pertença.

Maria do Rosário Pedreira
O Canto do Vento nos Ciprestes

domingo, 20 de abril de 2008

Da janela norte...

lugar a pedra

1 2 3, diz outra vez!

Bichinho de conta
Debaixo da pedra
Mora um bichinho
De corpo cinzento
Muito redondinho
Tem medo do sol
Tem medo de andar
Bichinho de conta
Não sabe contar
Muito redondinho
Rebola, no chão
Rebola, na erva
E na minha mão

Lenga-lenga tradicional.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Outra Janela...

Tanta pressa temos de fazer, escrever e deixar ouvir a nossa voz no silêncio da eternidade, que esquecemos a única coisa realmente importante: viver.
Robert Stevenson

Eternidade
- foi a palavra desta semana no foto-dicionário do blogue Palavra Puxa Palavra, curiosos e belíssimos foram os olhares revelados, este foi o olhar da Casa de Maio:
um longo caminho, um fim infinito, desconhecido...

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Da janela sul...

(in)dignação

Autores

Mar Incerto

Que triste o som acorda à minha voz!
Como é pálida a luz do meu espelho
e a desse rio azul que não tem foz:
o tempo, em que me vou fazendo velho.

Dias loucos da infância, onde estais vós?
E a alegria - esse cântico vermelho
do sangue virgem que não tem avós?
Como se chama a sombra em que ajoelho?

Arfa, cansado, no meu peito, um mar:
o mar remoto da remota Ilha
onde as sereias cantam ao luar.

A esteira dos navios, as gaivotas
gritam no céu, e o céu, lânguido, brilha
sem ecos de vitórias ou derrotas.

António de Sousa

terça-feira, 15 de abril de 2008

Outra Janela...

a chaminé II

voz do povo

Lenha verde e velho gogo, muito fumo e pouco fogo.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Outra Janela...

a chaminé I

voz do povo

Arde o fogo segundo a lenha do bosque.

domingo, 13 de abril de 2008

Da janela sul...

(h) eras idas...

Autores

Razão de ninguém eis o vazio da pátria
onde tudo se dissolve de onde irrompe a sinfonia
da ideal violência da consciência austera
em que germina o reconhecimento da chama silenciosa
coincidência ou brisa

Vertiginosa e justa
sobre desertos violáceos ou clareiras de pedra
sem recear os fatídicos coágulos
ela palpa a carnosa sombra
de um vegetal meio-dia
e procura a pousada sobre uma grande pedra
exposta às intempéries do vento e da água

Da razão de ninguém ela cria a razão de todos
dos flancos do nada extrai o tronco luminoso
que se retesa para um oceânico horizonte
O seu maior precioso talismã
é um vaso vazio
e não escolhe entre entre a formiga e a cigarra
porque ela é a obra do ócio em movimento
e navega na gôndola imaculada do deus inacabado.

António Ramos Rosa
Pátria Soberana seguido de Nova Ficção

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Outra Janela...

O amor e a amizade são como o eco: dão tanto quanto recebem.

Alexandre Herzen


*Bom fim-de-semana a todos!

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Da janela norte...

último Canto

Autores

Do Amor I

A névoa disse à árvore:
tu, cedro, perdes a tua forma,
se eu te abraço. Disse
o cedro: o Sol ama-me mais,
toma o meu corpo inteiro
no seu corpo e dá-lhe
ser, figura.

Fiama Hasse Pais Brandão
As Fábulas

terça-feira, 8 de abril de 2008

Da janela norte...III

do enCanto

voz do povo

Pela cor do manto, se conhece o canto.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Da janela norte...II

e o reCanto

Autores

Bárbaros

Vinham de longe, arrastados pelos ventos, e escondiam
nas mãos um punhado de areia fina para não esquecerem
o cheiro dos desertos. Subiram à montanha e,
com um ramo quebrado, puseram-se a riscar o contorno
do lago e os caminhos tortuosos das primeiras margens.
A água fascinava-os, como aos cavalos que traziam
alados e sem crinas para chegarem sempre mais cedo.

Nessa noite acamparam no vale. Assaram um veado. Beberam
às mulheres que haveriam de ter. E adormeceram
mais longe do céu.

Sonharam com o fogo para não terem de cortar o trigo.

De manhã, a planície estava ainda mais plana.

Maria do Rosário Pedreira
A Casa e o Cheiro dos Livros

domingo, 6 de abril de 2008

Da janela norte...I

o meu Canto

... era uma vez

Canto
do Lat. cantu
s. m.,
série de sons musicais cadenciados, formados pela voz;
acção de cantar;
divisão de certos poemas, principalmente dos épicos;
poesia que se pode cantar;
hino.
do Gr. kanthós, canto do olho
s. m.,
comissura palpebral;
por ext. comissura dos lábios.
do Lat. canthu, círculo de ferro que cinge a roda?
s. m.,
ângulo saliente ou reentrante formado pelo encontro de linhas ou superfícies;
pedra, esquadria de pedra;
junta ou aresta de uma tábua;
o lado do pão;
lugar afastado e pouco frequentado;
sítio esconso.
- do cisne: a última criação de um artista;
- da sereia: linguagem agradável e lisonjeira, para atrair;
olhar com o - do olho: olhar de soslaio.
in,Dic. Língua Portuguesa (ed. TE)
... e depois o meu Canto, reCanto, enCanto...

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Autores

As Fontes

Um dia quebrarei todas as pontes
Que ligam o meu ser, vivo e total,
À agitação do mundo do irreal,
E calma subirei até às fontes.

Irei até às fontes onde mora
A plenitude, o límpido esplendor
Que me foi prometido em cada hora,
E na face incompleta do amor.

Irei beber a luz e o amanhecer,
Irei beber a voz dessa promessa
Que às vezes como um voo me atravessa,
E nela cumprirei todo o meu ser.

Sophia de Mello Breyner Andresen

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Da janela sul...



trazias nos olhos a ave e a flor
o horizonte circular
o remoinho do rio em torno da pedra


Carlos Frias de Carvalho
Poema a uma deusa índia

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Outra Janela... III

Sim!

voz do povo

De um "Sim" e de um "Não", nasce toda a questão.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Outra Janela... II

Talvez...

voz do povo

A incerteza é, talvez, o maior dos males.