sábado, 1 de dezembro de 2007

Hoje

O meu amor não cabe num poema - há coisas assim,
que não se rendem à geometria deste mundo;
são como corpos desencontrados da sua arquitectura
ou quartos que os gestos não preenchem.

O meu amor é maior que as palavras; e daí inútil
a agitação dos dedos na intimidade do texto -
a página não ilustra o zelo do farol que agasalha as baías
nem a candura da mão que protege a chama que estremece.

O meu amor não se deixa dizer - é um formigueiro
que acode aos lábios como a urgência de um beijo
ou a matéria efervescente dos segredos; a combustão
laboriosa que evoca, à flor da pele, vestígios
de uma explosão exemplar: a cratera que um corpo,
ao levantar-se, deixa para sempre na vizinhança de outro corpo.

O meu amor anda por dentro do silêncio e formular loucuras
com a nudez do teu nome - é um fantasma que estrebucha
no dédalo das veias e sangra quando o encerram em metáforas.
Um verso que o vestisse definharia sob a roupa
como o esqueleto de uma palavra morta. Nenhum poema
podia ser o chão da sua casa.

Maria do Rosário Pedreira

O Canto do Vento nos Ciprestes

6 comentários:

Maria disse...

Este poema lembrou-me Pablo Neruda....

Beijinho

Manuel Veiga disse...

que poderia o amor fazer senão "formular" loucuras?

belo poema!

bettips disse...

..."a cratera que um corpo, ao levantar-se, deixa para sempre
na vizinhança de outro corpo".

Assim o poema-amor-ausência se ilumina. Bjinhos

Luis Eme disse...

Nenhum amor cabe num poema...

são sempre precisos mais,

tu sabes, eu sei e a Maria do Rosário (será Rosarinho lá em casa?) também...

abraço

pin gente disse...

acho que não será apenas hoje...

beijo
luísa

poetaeusou . . . disse...

*
o meu amor,
sabe a vento . . .
,
j
h
*