sábado, 20 de maio de 2006

Ao amanhecer ...

Afasto as cortinas devagar; e, atrás dos vidros, acordo
o silêncio de um muro de granito onde já não se demora
a luz. Lembro-me sem querer de ti e convoco as memórias
de um quarto antigo para não repetir o que os livros
diriam sempre de outro modo. Contemplo a surda vegetação

da sombra, os pequenos animais à deriva, a noite rasgada
ao meio pelos gumes da lua. Aguardo provavelmente o teu
regresso, embora secretamente. Mas o que acode à janela

é uma impressão luminosa e fria que desfigura o olhar
e dá das coisas apenas metades imperfeitas ou estilhaços
que lembram a arquitectura da poeira sobre as baías.

A sabedoria é um gomo amargo que se consome junto aos
lábios. Ainda que quisesse murmurar o teu nome, como
o sol a morder os pátios de manhã, calo-me para sempre.
Esqueço-me talvez de ti, embora secretamente.


Maria do Rosário Pedreira
A Casa e o Cheiro dos Livros

5 comentários:

João disse...

feliz contemplada , um beijinho

filomena disse...

Gostei do texto.
Bom fim-de-semana.

Beijinhos

porfirio disse...

:
poesia de cunho original
e de mãos limpas no papel
.

boa escolha maria p.

bjo especial
e
bom fim-de-semana

Clotilde S. disse...

Sorrisos. O meu filho deu-me este livro pelos meus anos. Só o título e a capa já bastam para neles me retratar.Quanto ao conteúdo....uma maravilha!
Beijos grandes amiga

Maria P. disse...

Obrigada João.

Filomena bom domingo.

Porfirio, obrigada e bom domingo

Jasmim eu tenho o gosto muito especial pela poesia da Maria do Rosário Pedreira, identifico-me nas suas palavras. Existe outro livro dela que também me encanta O Canto do Vento nos Ciprestes, deves conhecer.

Um beijinho a todos, amigos.